Quando eu te
conheci, três anos atrás, mais ou menos, você não passava de um pré-adolescente
bobão. Tímido, mas brincalhão com aqueles que conhecia. Tinha um penteado
ridículo e se achava feio. Eu concordo, você era feio. Ambos éramos, aliás. Eu
tinha um cabelo horroroso e não passava de uma tripinha reclamona que gostava
de tomar partido das coisas. Sentávamos perto um do outro e isso acabou nos
aproximando. Eu tive uma quedinha por um menino da nossa sala (na escola) e
você era apaixonado por uma colega minha dessa mesma sala. Eu ficava chocada
com os seus métodos de conquista e resolvi te ajudar. Você ficava me ouvindo
falar do menino que eu gostava sem reclamar, me dizendo quando e como eu estava
errando. Conversávamos no telefone por horas e você odiava quando eu dizia que
ia desligar porque queria ligar para o tal menino que eu estava a fim.
Passamos esse
ano sendo amigos de sala e, fora da escola, grandes amigos. No ano seguinte eu
me mudei e ambos receávamos perder a amizade um do outro. Ficávamos com medo de
não conseguirmos mais nos ver, de um esquecer do outro. Isso não aconteceu.
Pelo contrário, aliás. Não sei da onde, mas dentro de mim surgiu um amor
incontrolável por você, que não media distância nem impossibilidades, só sabia
querer mais e mais essa amizade enorme que havia entre nós. Você passou a ser
meu melhor amigo, e eu, a sua. Depois de um ano de distância e horas a fio de
conversa pelo telefone, nos encontramos, finalmente. Quando eu te vi caminhando
em minha direção meu coração ganhou vida novamente. Aquele meu pedaço que
estava contigo não estava mais distante. Nos abraçamos e ficamos conversando o
tempo todo, colocando os assuntos em dia (sempre existiu assunto entre a gente,
mesmo que nos falássemos todos os dias. Você até costumava dizer que queria ter
tanto assunto com as garotas que estava a fim como tinha comigo). As horas
foram passando e quando chegou o momento de partir, choramos a nossa despedida.
Esse choro foi acompanhado de muitos soluços e promessas de “nunca” e “para
sempre”.
Continuamos
com aquela amizade arrebatadora. Eu ouvindo você reclamar da sua
namorada-problema que achava que tínhamos um caso (não havia nem maldade entre
nós, nossa!) e você me ouvido falar do cara que eu estava loucamente
apaixonada, mas que havia me trocado por outra sem ao menos ter a dignidade de
me dar uma explicação. Ouvia eu dizer o quanto eu queria que ele estivesse
comigo e o quanto eu queria que ele sumisse quando ele resolveu aparecer
novamente. Você me viu presa nesse rolo por um ano e meio, e eu vi você
terminar com a aquela sua namorada dizendo que não gostava mais dela.
Nós nunca tínhamos
tido uma briga para nos afastar. A primeira vez que realmente paramos de nos
falar foi quando você mentiu para mim e eu, com raiva, contei coisas deturpadas
sobre você para a sua namorada da época. Nossa, como me arrependo disso! Eu fui
uma criançona idiota e não sei como você foi capaz de me perdoar pelo que fiz. Mas
um dia a gente simplesmente voltou a se falar, você dizendo que confiava em mim
cem por cento novamente, e eu, com problemas gigantes de confiança depois
daquele meu caso, ficava com um pé atrás contigo. Porém isso não durou muito.
Eu te amava demais e nós tínhamos uma empatia enorme para nos mantermos
afastados. Voltamos a nos chamar por apelidos e a se declarar um para o outro
como nos velhos tempos. A cumplicidade voltou e com ela veio a massacrante
saudade.
Depois de mais
um ano de distância, você havia crescido e eu também. Finalmente podia vir à
minha casa me visitar. Foi o que fizemos. Você se livrou do compromisso que te
prendia todos os finais de semana e marcamos de você passar o domingo comigo.
Eu mal podia esperar para ver o meu melhor amigo novamente. Estava contando as
horas para te abraçar de novo. As minhas amigas já estavam cansadas de ouvir o
seu nome, pois eu falava da sua chegada a todo tempo. Sendo assim, fui te
buscar onde havíamos combinado e, quando te vi, tudo mudou. Alguma coisa dentro
de mim deu um clique, bem baixinho e discreto, mas deu. A primeira coisa que eu
pensei quando te vi foi o quanto você estava gostoso. Juro! Logo depois
balancei a cabeça afastando o pensamento, pois você era meu amigo, meu melhor
amigo, e nada, jamais, poderia acontecer entre a gente. Por isso eu não percebi
o clique de imediato. Fui ao seu encontro, você me levantou no ar em um abraço
apertado, e fomos para a minha casa. O dia correu perfeitamente. Não havia
buracos de silêncio constrangedores entre a nossa conversa, pois a intimidade
que nos envolvia sempre foi gigantesca e não era nunca abalada pela distância
que sempre nos separou. Mas nossos abraços estavam diferentes. Eram não só
calorosos e aconchegantes; eram eletrizantes. O clique estava gritando em mim e
eu não sabia distinguir que barulho era aquele. Tentei dizer à você o que
estava acontecendo, mas não consegui. Mantive-me em silêncio, deixando tudo
fluir naturalmente. Pois bem, fluiu. Nossa amizade foi modificada para sempre e
de uma forma devastadora.
Nossos corpos
passaram a se procurar e se necessitar intensamente. Não sabíamos o que estava
acontecendo. Eu te queria tanto e de tantos jeitos que não sabia qual deles
escolher. Você passava pelo mesmo. Depois de muitos conflitos e indecisões
resolvemos seguir em frente já que parar onde estávamos só causaria sofrimento.
Conseguimos nos manter por mais ou menos um mês nessa amizade com benefícios,
até que a perfeição começou a ruir. Você não me mandava mais mensagens de
saudade ou de carinho. Não escrevia mais dizendo o quanto queria me ver e o
quanto havia pensado em mim. Logo em seguida, deixou de falar comigo. Passou a
me ignorar totalmente. Não me respondia mais em lugar nenhum e, quando
raramente o fazia, me deixava falando sozinha depois. Eu, que sempre fui a
favor de tentar resolver as coisas primeiro em vez de se afastar sem saber o
que estava acontecendo, fui falar contigo. Incontáveis vezes. De diversas
maneiras. Mas você continuava me tratando do mesmo jeito, sempre afirmando
(quando acontecia de me responder) que estávamos bem, que a amizade não estava
sofrendo nenhum dano e que eu fazia tempestade num copo d’água.
Chegou o dia
que eu cansei de correr atrás. Quando um não quer, dois não brigam, não é esse
o ditado? Pois bem, aceitei te deixar partir. Excluí você de todos os lugares
que poderíamos ter contanto. Fiz isso por dois motivos: para não ficar
acompanhado a sua vida como coadjuvante, sabendo que você estava feliz sem me
ter e que não fazia questão de falar comigo; e porque temia que, em um momento
de fraqueza, eu pudesse me render e correr atrás de você mais um vez (como já
aconteceu no passando graças a bebida). Depois disso você veio perguntar porque
eu tinha te excluído, mas não parecia se interessar realmente. Parecia mais uma
obrigação. Deu-me umas respostas indiferentes e voltou a fazer o que estava
fazendo. Naquele dia você me destruiu. Eu chorei um choro desesperado, perdido.
Não entendia como você, logo você, era capaz de me faz mal daquela maneira.
Você empurrou mais fundo a estaca que antes havia cravado em meu coração.
Dramática essa metáfora, eu sei, mas a dor que eu senti foi fora do comum.
Continuei
sofrendo, cada dia mais. Eu estava me afundando em um buraco e, mesmo sabendo a
saída, não consegui querer sair dele. Eu só queria você, de qualquer forma, de
qualquer jeito. Eu não te amava mais somente como amigo, percebi, eu te amava
como homem. Eu te queria como uma mulher quer um homem. Esse amor era tão
grande, tão imensurável... acho que nunca vou amar alguém como te amei.
Fiquei nisso
por um tempo, me afundando em coisas inúteis só para ocupar minha cabeça e
assim conseguir distraí-la da dor. Mas isso ia chegar ao fim. Chegou. Um dia,
sem mais nem menos, eu estava conversando com uma amiga, amigona, próxima
mesmo, que você conhecia e sabia dessa nossa amizade. Eu estava conversando com
ela quando a mesma me contou que você deu em cima dela. Você deu em cima dela!
Na hora eu parei, olhei para ela, disfarcei, abaixei os olhos e passei a olhar
para dentro de mim mesma. Primeiro eu fui possuída por um ódio gigantesco. Se
você estivesse na minha frente naquele momento eu teria acabo contigo. De todos
os jeitos. Fiquei com ódio da sua falta de moral, caráter, consideração, tudo!
Depois veio a verdade: você não sentia absolutamente nada por mim mais.
Amizade, amor, atração, o que fosse, nada. Eu passei a ser uma migalha de pão
velha que você jogou aos pombos, pois te era útil.
Depois daquilo
eu passei a querer te tirar de mim, e quando se quer algo que depende
exclusivamente de si próprio, se consegue. Apaguei todas as suas mensagens do
meu celular e as que eu havia te enviado também. Antes eu ficava remoendo essas
lembranças como uma tolinha apaixonada. Eu deixei de ser. Parei de falar de
você para as pessoas. Parei de procurar saber de você. Parei de chorar por tua
causa ou de me entregar a qualquer sentimento que tivesse relação com a sua
pessoa, seja ele negativo ou positivo. Você é passado para mim. Primeiro porque
você escolheu isso, e agora porque eu quero.
De alguma
forma eu sempre vou te amar. Sempre vou me lembrar de você de um jeito bom na
maior parte das vezes, mas não vai passar disso, porque se ameaçar passar, eu vou
impedir. Essa história de “guardar só as memórias boas” só da certo para quem
está em um estágio bem avançado de iluminação. Comigo isso só funcionaria como
incentivo para correr atrás. Por isso, por enquanto, não quero lembrar de você
de jeito nenhum. Não vou me deixar encher os olhos de lágrimas por sua causa
outra vez. Um dia, quem sabe, eu me deixe pensar em você novamente, e quando o
fizer, será de forma madura e humorada, para rir das besteiras que eu possa ter
feito e apenas continuar seguindo com a minha vida.
Por agora eu
digo que te evito, pois estou em estágio de recuperação. Eu te amo. Muito,
absurdamente. Mas você não merece esse amor, nem o quer. Então eu vou
guardá-lo, enterrar esse sentimento comigo, tentando sempre usá-lo como
aprendizagem e esperando sempre conseguir seguir em frente. Mas lembre-se: você
quebrou todas as nossas promessas. Só hoje eu posso ver que o nosso “para
sempre” nunca existiu.